COP30 e o Direito Médico Preventivo

Autor: Giovani Luís Padão Merenda – Acadêmico de Direito / Diretor Executivo do Hospital Jean Bitar – Belém/PA

Instagram: @conhecendodireitomedico – Belém – PA – 2025

Propomos uma reflexão sobre as intersecções entre o Direito Médico, o Direito Médico Preventivo e os desafios contemporâneos das mudanças climáticas, tomando como referência a realização da COP30 na cidade de Belém do Pará.

É de extrema importância percebermos como o aquecimento global e a crise ambiental configuram não apenas um problema ecológico, mas também um fenômeno jurídico-sanitário, exigindo novas práticas de prevenção, gestão e responsabilização dentro do sistema de saúde.

Nossa análise evidencia que a efetividade do direito fundamental à saúde depende, cada vez mais, da integração entre políticas ambientais e sanitárias, sob a ótica da prevenção e da governança climática.

A cidade de Belém, capital do Estado do Pará, será palco da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30), evento que reunirá líderes mundiais para debater o futuro ambiental do planeta e as estratégias globais de mitigação e adaptação às mudanças climáticas.

No entanto, a pauta ambiental da COP30 transcende os limites da ecologia: ela toca diretamente o campo da saúde pública e, portanto, também do Direito Médico e da Saúde.

As alterações climáticas afetam determinantes essenciais da saúde humana — o ar, a água, o alimento e o abrigo. Ondas de calor, poluição atmosférica, escassez hídrica, vetores de doenças tropicais e eventos climáticos extremos repercutem sobre a saúde física e mental das populações.

Dentro desse cenário, emerge a necessidade de um olhar jurídico-sanitário mais abrangente, capaz de compreender o ambiente como elemento essencial à concretização do direito fundamental à saúde, previsto no artigo 196 da Constituição Federal de 1988.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) reconhece que a crise climática é também uma crise de saúde. O aumento da temperatura média global provoca o surgimento e a expansão de doenças infecciosas, agrava quadros respiratórios e cardiovasculares, compromete a segurança alimentar e intensifica situações de vulnerabilidade social.

Na Amazônia, região estratégica e biologicamente sensível, tais impactos se agravam em razão da precariedade de infraestrutura sanitária, da alta incidência de doenças tropicais e da desigualdade no acesso aos serviços de saúde.

Desta forma, o Direito da Saúde passa a ser instrumento de concretização da justiça climática, exigindo do Estado e das instituições de saúde a adoção de políticas preventivas, de adaptação e de mitigação de riscos.

Essa integração normativa entre meio ambiente e saúde é amparada pelos princípios da prevenção, da precaução e da solidariedade intergeracional, previstos na legislação ambiental e compatíveis com a ordem constitucional brasileira.

O Direito Médico Preventivo é uma corrente que busca antecipar litígios e promover a segurança jurídica na saúde e assim sendo, assume protagonismo nesse debate. A sua essência está na atuação antecipatória e educativa, voltada à gestão de riscos, à elaboração de protocolos, à conformidade ética e normativa e à proteção da relação médico-paciente.

Quando aplicado ao contexto climático, o Direito Médico Preventivo amplia sua esfera de atuação, passando a compreender o risco ambiental como um dos fatores determinantes da saúde e, portanto, como elemento integrante da responsabilidade institucional e profissional.

Hospitais e clínicas, por exemplo, devem incluir em seus planos de contingência medidas voltadas à adaptação climática, gestão de resíduos, eficiência energética e continuidade dos serviços de saúde em situações de emergência ambiental.

Assim, a prevenção jurídica ganha uma nova dimensão, não apenas evitando litígios médicos, mas prevenir danos coletivos à saúde decorrentes da crise ambiental. Trata-se de um avanço conceitual e ético, que reposiciona o Direito Médico Preventivo como ferramenta de sustentabilidade e governança institucional.

As mudanças climáticas acentuam desigualdades históricas, onde as populações mais pobres, indígenas, ribeirinhas e periféricas sofrem de forma desproporcional os efeitos da degradação ambiental.

Nesse contexto, o Direito da Saúde deve operar sob o prisma da equidade, garantindo o acesso universal e igualitário a serviços de saúde adequados às novas ameaças climáticas.

A justiça climática exige uma abordagem interdisciplinar, fazendo com que o médico, o gestor e o jurista passem a compreender que a proteção da vida humana está vinculada à proteção do meio ambiente. A integração entre bioética, saúde pública e direito ambiental é o caminho para uma resposta efetiva à crise global.

A escolha de Belém como sede da COP30 tem significado simbólico e prático, pois a Amazônia é, simultaneamente, o pulmão do mundo e uma das regiões mais afetadas pelas mudanças climáticas.

Ao sediar o evento, a capital paraense se transforma em laboratório mundial de inovação socioambiental, convidando gestores, profissionais da saúde e operadores do direito a construírem modelos sustentáveis de cuidado e prevenção.

Para os profissionais do Direito Médico e da Saúde, trata-se de um chamado à ação para revisarem práticas, adaptarem contratos, promoverem capacitações e incorporarem cláusulas de responsabilidade ambiental e sustentabilidade nas relações institucionais, onde o hospital do futuro será não apenas tecnológico e humanizado, mas também ambientalmente responsável e juridicamente preventivo.

A COP30 representa mais do que uma conferência global sobre o clima, é também um marco civilizatório que impõe aos sistemas de saúde e de justiça novos deveres éticos e jurídicos.

O Direito Médico Preventivo, ao articular a gestão de riscos com a proteção da vida, desponta como instrumento estratégico na era das mudanças climáticas.

Cuidar do planeta é cuidar da saúde humana, é prevenir no âmbito jurídico e médico, é garantir não apenas a ausência de litígios, mas a preservação da vida em um ambiente saudável e sustentável.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE (OMS). Climate crisis is a health crisis – WHO urges urgent action ahead of COP30. Brasília, 2025.

ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU). United Nations Climate Change Conference – COP30, Belém 2025. UNFCCC.

MINISTÉRIO DA SAÚDE. Plano Nacional de Adaptação à Mudança do Clima – Eixo Saúde. Brasília, 2023.